O quarto Mago

Imprimir página

É comum vermos quadros com os três sábios do Oriente que foram a Belém visitar o Menino Jesus, presenteando-o com ouro, incenso e mirra. Normalmente, os magos costumam ser representados como reis, embora não conste nos evangelhos que realmente o fossem, e estão diante do Menino que se encontra no colo de Maria. Há muitas lendas a respeito desses sábios. Transcrevo aqui, com minhas próprias palavras, uma delas, de origem dinamarquesa.

Gaspar, Melquior e Baltasar – nomes que a tradição popular dá aos três personagens – colocaram seus presentes diante do Menino e de sua Mãe. Maria sentiu-se honrada, mas Jesus não quis sorrir: não se sentiu atraído pelo ouro luzente; a fumaça do incenso o fez tossir, e desviou o olhar da mirra.

Os três reis magos levantaram-se e partiram. Logo que seus camelos desapareceram entre as colinas, chegou o quarto rei. Vinha de um país banhado pelo Golfo Pérsico. Também vira a estrela iluminando o céu. Escolheu, então, um presente raro: três grandes pérolas. Saiu decidido a procurar o lugar sobre o qual brilhava a estrela.

Encontrou-o, mas chegou tarde… Os outros magos já haviam partido. Chegou atrasado e de mãos vazias.
Esse quarto rei entrou cuidadosamente na gruta onde estavam o Menino Jesus, Maria e José. Anoitecia e o local estava mergulhado na escuridão. Um fraco odor de incenso mantinha-se no recinto, como uma igreja após uma Missa festiva. José ajeitava a palha na manjedoura e o Menino Jesus estava no colo da mãe. Ela o embalava docemente e sussurrava uma das canções de ninar que ainda hoje se ouvem nas casas de Belém.

O rei da Pérsia aproximou-se lentamente, hesitante, temeroso… Lançou-se aos pés do Menino Jesus e começou a lhe falar: “Senhor, eu devia ter vindo com os outros reis que lhe trouxeram seus dons. Eu também estava lhe trazendo um presente: três pérolas preciosas, grandes como ovos de pássaro; três pérolas do Mar Pérsico. Não as tenho mais, Senhor. Acontece que, na primeira noite, parei em um albergue, para ali passar a noite. Quando entrei, vi um velho tremendo, com febre, estendido no chão, junto ao fogo. Ninguém o conhecia. Sua mala estava vazia. Não tinha dinheiro para procurar um médico ou para comprar remédios. Seria mandado embora dali no dia seguinte. Pobrezinho! Era um senhor muito velho, magro, com uma barba grande… lembrava meu pai. Então, peguei uma pérola e a dei ao dono do albergue para que cuidasse daquele senhor.

Na manhã seguinte, parti. Apressei-me quanto pude para alcançar os outros magos. A estrada cortava um extenso deserto, onde enormes rochas erguiam-se diante de mim. De repente, ouvi gritos. Saltei de meu camelo e vi soldados que haviam prendido uma jovem. Eram numerosos; não adiantaria querer lutar contra eles, para libertá-la. Perdoe-me, Senhor, mas com a segunda pérola consegui a liberdade da moça. Ela beijou-me as mãos e, mui rápida, fugiu em direção das montanhas.

Sobrara-me apenas uma pérola. Eu queria trazer-lhe ao menos aquela. Já era mais de meio-dia e eu esperava chegar aqui à tarde. Mas vi uma vila incendiada pelos soldados de Herodes, que executavam a ordem de matar todas as crianças com menos de dois anos de idade. Perto de uma casa em chamas, um soldado balançava um menino nu, segurando-o por uma perna. A criança gritava e se debatia. O soldado dizia: “Agora o jogarei nas chamas”. A mãe gritava desesperada.

Senhor, perdoe-me… Peguei a última pérola e a dei ao soldado, para que ele devolvesse o filho à mãe. Ele aceitou minha proposta. A mãe agarrou o menino, apertou-o contra o peito e fugiu correndo, sem mesmo se despedir de mim. Senhor, eis porque minhas mãos estão vazias. Perdoe-me!”

Fez-se um silêncio na gruta. O rei inclinou-se e depois ousou erguer os olhos. José tinha-se aproximado com uma xícara de chá. Maria olhava o filho que estava no seu colo. Será que o Menino dormia? Não! Jesus não dormia. Lentamente virou-se para o visitante. Seu rosto resplandecia. Estendeu as mãozinhas na direção do quarto mago do Oriente e sorriu.

Dom Murilo S.R. Krieger
Arcebispo de Salvador (BA) e Primaz do Brasil.

Texto copiado do site da CNBB.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *